Parto

Foi um corte na barriga, mais profundo do que parece. Atingiu o coração, atravessou a linha da vida. Por ele saiu um ser para viver e escorreu outro para morrer todos os dias.

Foi um corte mais profundo do que parece. Não há um dia que não haja dor e uma vontade incontrolável de chorar, de se esvaziar em lágrimas tentando se encher de esperança. Mas a esperança não vem. Na verdade, ela foi embora, fugiu no primeiro rasgão da carne, juntamente com a felicidade.

Foi um corte mais profundo do que deveria ser. Abalou a mente, acabou com o equilíbrio, abriu as portas para o caos, que se instaurou sem pedir licença, sem ter pena, sem dar espaço para o consolo.

Foi um corte mais profundo do que deveria ser. Deixou uma marca na pele e uma ferida na alma, que não fecha. Uma ferida que é magoada com frequência, sem piedade, principalmente por meio de palavras. Ela dói no frio da noite, mas também no calor do dia, ela dói, não importa a hora ou a estação.

Foi um corte profundo, muito além do que se pode ver ou apalpar. Na verdade, suas consequências são difíceis de ser percebidas por outras pessoas, apenas o ser dilacerado pode senti-las. Uma incisão violenta, irrecuperável, que priva da liberdade, que impede a vida de acontecer, mas que não dá a ela um ponto final, fazendo o sofrimento ser indissolúvel.

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